quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

A toga e o rei nu.

A reação dos magistrados ao noticiário dos jornais sobre os conflitos entre as entidades corporativas representantes de juízes e desembargadores e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é componente de um diagnóstico sobre o comportamento da classe em relação ao processo democrático. O Poder Judiciário sempre foi bastante opaco. A cultura aristocrática que permeia a sua história é revelada em discursos e argumentos do presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Nelson Calandra, ou mesmo do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso. Para ambos, os privilégios, que beneficiam juízes e desembargadores, anotados pelos jornais são apenas direitos amparados por leis. Agora, amplia-se a crítica aos jornais, que, segundo o desembargador Tourinho Neto, integrante do CNJ, "na maioria das vezes marrom, está acuando o juiz. O juiz desonesto deve ser excluído, mas não é assim que a imprensa está fazendo. Precisamos das associações para lutarmos contra essa imprensa marrom." A afirmação, publicada na edição de hoje (15/02) da Folha de São Paulo, se soma à expressão "notícias infamantes", de autoria do ministro Peluzo, para quem, pelo menos parece, os jornais seriam os responsáveis por manchar a instituição da Justiça.
Em entrevista no programa Roda Viva (13/02), TV Cultura, o presidente da AMB, Nelson Calandra, rico na capacidade de tergiversar, afirmara que o fato de a Confederação Nacional de Seguros ter patrocinado quatro dias de estadia e debates "acadêmicos" em suntuoso hotel no Guaruja não se constituía em conflito de interesses entre magistrados e possíveis vítimas de procedimentos ilícitos das seguradoras integrantes da entidade. Segundo ele, reiteradamente, os juízes e até ministros que participaram daquele evento, em outubro passado, ali estavam para "trabalho". Porém, não foi perguntado ao desembargador se os mesmos juízes aceitariam participar de "debates acadêmicos" com federações ou associações de moradores de periferia, sem teto, ou entidade similar. E se tal iniciativa seria comum como aquela patrocinada pela confederação de seguradoras.
Agora, a ministra Eliana Calmon, do CNJ, quer que seja baixada uma resolução que discipline e proíba os juízes e desembargadores de participar de eventos semelhantes. Contra a iniciativa, o presidente do órgão, Cezar Peluso, defende tratar do tema no Código de Ética da magistratura, dado os aspectos subjetivos de tais situações. 
O Poder Judiciário, portanto, nunca esteve tão exposto como nos últimos dois anos, pelo menos. Aí reside a questão central: a democratização da sociedade exige que os poderes públicos e as autoridades de todos eles prestem satisfação a todos os cidadãos. A resistência de inúmeros magistrados às ações do CNJ e às críticas formuladas por jornalistas e especialistas é evidente sintoma da visão centrada, hierárquica e aristocrática que ainda contamina o Poder Judiciário. 
Mas, como instituição de Estado, o Poder Judiciário deve ser preservado e defendido como parte intrínseca da sociedade política brasileira. Isso não se confunde com o magistrado corrupto, omisso e permissivo, porém. Ou seja, é fundamental separar o agente de governo do Estado. Há segmentos destacados na magistratura que contribuem significativamente para fazer com que o Judiciário se aproxime mais da sociedade, particularmente das camadas mais desassistidas pelo poder. Os esforços recentes para dinamizar esse diálogo entre poder e sociedade é fruto da vontade política daqueles que carregam a convicção do aperfeiçoamento do processo democrático. O preço é a visibilidade e a submissão do Judiciário à vontade da sociedade brasileira, expressa na Constituição do País.
Parece consensual e pacífico o reconhecimento de um Poder Judiciário correto, comprometido com a democratização do País e com os valores republicanos. Mas, debater e expor as ações da magistratura e as contradições inerentes ao serviço público do Estado são medidas salutares. Muitos juízes, desembargadores e ministros precisam aprender e cultivar o processo democrático, sem se submeter à tecnicalidade jurídica que muitas vezes barra a realização de decisões ousadas e fundamentais para o aperfeiçoamento daquilo que chamam de justiça. E também se verem como servidores de uma sociedade que clama desesperadamente por justiça, não apenas pelo poder judiciário.
A toga não foi confeccionada para vestir um rei nu. 

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O futuro e a esperança

No Correião, hoje (07/02):

- "Prefeitura irá rever seus equipamentos de assistência social para reduzir o número de pessoas em situação (sic) de rua." (capa, com os verbos no futuro do presente)


- "Não vamos apostar no trem de alta velocidade (TAV) porque eu não acredito nele. É um projeto que não se sustenta em pé, por falta de demanda." Carlo Alberto Butareli, novo gestor do Consórcio Aeroportos Brasil, que ganhou a licitação para operar Viracopos, em reportagem de Maria Teresa Costa, p. A5.

- "Ninguém entendeu, nem mesmo assessores ligados ao prefeito Pedro Serafim (PDT), o 'rolo' da nomeação do tucano Ulysses Semeghini para o comando da Secretaria do Planejamento. O pedetista garante que teve o sinal verde de Semeghini, que, por sua vez, nega formalmente que tenha aceitado o convite." Nota da coluna Xeque-Mate, assinada por Ricardo Alécio, p. A6.

- "Assim que o Aeroporto Internacional de Viracopos foi privatizado, ontem, o prefeito de Campinas, Pedro Serafim (PDT), estipulou um prazo de seus meses para que os Planos Locais de Gestão (PLGs) das macrozonas sejam enviados à Câmara." Mais uma vez o futuro é o cenário da Prefeitura. Abre de texto assinado por Milene Moreto, p. A6.

- "Ulysses Cidade Semeghini, professor de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), negou ontem ter aceitado o convite do prefeito Pedro Serafim (PDT) para chefiar a Secretaria de Planejamento. Apesar disso, sua nomeação foi publicada no Diário Oficial do Município junto com a designação ao cargo de 'gratificação de apoio técnico1 do então secretário Alair Godoy." - É o "rolo" de que fala Ricardo Alécio, em texto assinado por Bruna Mozer, p. A6.

- "O projeto de lei que autoria do prefeito de Campinas, Pedro Serafim (PDT), que autoriza a doação de uma área de 30 mil metros quadrados para a construção da Delegacia da Polícia Federal foi retirado ontem da pauta da sessão da Câmara, por um problema técnico." O problema técnico é a ausência exata da localização da área, segundo o vereador Tadeu Marcos. Texto de Milene Moreto, na p. A7.

- "Quase um mês depois de publicar uma reportagem sobre o abandono de seis praças de esportes de Campinas, o Correio visitou os locais e constatou que as melhorias prometidas pela Prefeitura não foram cumpridas. "Texto de Patrícia Azevedo, na p. A11, que duvida das promessas sobre coisas futuras prometidas pela Prefeitura do prefeito em exercício Pedro Serafim Jr.

- "Apesar de a Prefeitura ter prometido retirar o entulho da praça que funciona ao lado da Subprefeitura de Barão, o local continua repleto de lixo e se transformou em um ponto de consumo de drogas." Mais uma vez o futuro, na mesma reportagem de Patrícia Azevedo.

Estranho esse governo municipal, não???

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Um Judiciário mais republicano

A decisão do Supremo Tribunal Federal em considerar e assegurar o poder constitucional do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de abrir investigação contra juízes e desembargadores de modo concorrente às Corregedorias Estaduais é um passo importantíssimo para a democratização do Poder Judiciário. Até hoje, o Judiciário é o poder bastante opaco e impermeável ao controle social como requer um sistema republicano. Ao mesmo tempo, o Supremo julgou constitucional as sessões públicas nas quais juízes são julgados por razões disciplinares. É a aplicação do princípio da publicidade, previsto no artigo 37 da Constituição Federal, e que prevalece sobre o sigilo processual para abrigo dos direitos de privacidade e intimidade. Juiz é servidor público, agente do Estado, portanto está submetido às leis como qualquer outro servidor. Aliás, são passos importantes em direção a próximas etapas destinadas a eliminar os privilégios dos altos servidores públicos, como deputados, governadores, ministros de Estado e até prefeitos que usufruem do injusto e anti-democrático benefício do fórum privilegiado quando submetidos a processos judiciais. 

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), autora das ações contra o poder do CNJ e em favor do sigilo dos julgamentos disciplinares dos juízes, perde muito com tais decisões que revelam, sim, o caráter corporativo da entidade associativa. Ganham os juízes, desembargadores e ministros que carregam a convicção da consciência democrática e republicana. Ponto para a Associação dos Juízes para a Democracia, cujo presidente, o juiz José Henrique Rodrigues Torres, titular da Vara do Juri de Campinas, se manifestou em diversas ocasiões em favor dos poderes do CNJ. É um salto fundamental para ampliar os requisitos de uma sociedade civilizada e mais igualitária.